Especialista alerta para exploração indiscriminada de recursos naturais que reduz as possibilidade de felicidade no mundo contemporâneo
Apesar de todos os alertas e evidências de que o atual modelo de produção e consumo mundial conduz a humanidade a uma grande mudança ambiental e prejudica sensivelmente a qualidade de vida desta e das próximas gerações, nada indica que o curso traçado pelo capitalismo selvagem possa dar a guinada necessária para interromper ou mesmo reduzir o ritmo de devastação do meio ambiente e da saúde da população mundial.
Mesmo assim o professor Mohamed Habib, do Instituto de Biologia e Pró reitor de Assuntos Comunitários da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), insiste em demonstrar, de maneira didática e criativa, como as pessoas estão se distanciando da felicidade ao adotarem a riqueza material como parâmetro de sucesso pessoal e profissional. “A saúde e qualidade de vida são determinados por fatores ambientais físicos, químicos, biológicos e sociais. A saúde ambiental é a base para o desenvolvimento sustentável. Os debates suscitam uma capacidade maior para aproveitamento dos recursos naturais sem agredir o meio ambiente, seguindo quatro posturas básicas: avaliação, correção,controle e prevenção”, ensina o professor.
Habib destaca ainda que os jovens atualmente possuem mais acesso à tecnologia e conhecimento, e isto também tem um lado positivo e um negativo. “As doenças ocupacionais hoje são diferentes, e só são reconhecidas como doenças ocupacionais, como LER (lesão por esforço repetitivo) e DORT (doenças osteomusculares relacionadas ao trabalho) quando a Medicina descobre a causa no aumento de casos”, exemplifica.
Nos aspectos positivos estão o maior acesso ao conhecimento e descobertas da Medicina, mas os mesmos instrumentos que os viabilizam resultam em lixo tóxico com metal pesado dos computadores e máquinas de diagnóstico. “Os Estados Unidos mandam o lixo eletrônico para a Nigéria e a Europa para o Quênia. Um ministro europeu justificou a medida com o seguinte argumento: os produtos causam câncer, mas só se manifesta depois de 48 anos e a expectativa de vida no Quênia é de 37 anos”, contou o professor, para espanto da platéia.
PIB e FIB
As riquezas dos países se traduzem pelo PIB (Produto Interno Bruto), que é a soma calculada do que é produzido em um país dividida pela população. Há três anos, quando o rei do Butão, considerado o país mais pobre do mundo em relação ao PIB, foi questionado na ONU sobre a situação de seu povo, respondeu: “Nós temos o menor PIB, mas a maior FIB do mundo.” Atônita, a platéia quis saber o que era o FIB. “Felicidade Interna Bruta”, respondeu o rei.
“Desde então os países passaram a trabalhar com outros índices de qualidade de vida, que se traduzem em felicidade, como indicadores sociais, afetivos, solidariedade, confiança e prazer”, exemplificou Habib. Segundo ele, no Butão não se conhece o que é stress, depressão ou LER/DORT, porque a sociedade vive de maneira primitiva e valoriza as relações sociais, pessoais, a família, a religião, a natureza e a vida simples. O Reino do Butão fica entre a China e a Índia, próximo do Tibet.
O professor Habib apresentou ainda outros fatores do mundo contemporâneo que degradam a qualidade de vida: 80% da humanidade vive em cidades, em áreas urbanas sem verde, ambiente de altos riscos sociais e ambientais; duas crianças morrem por minuto no mundo vítimas da malária; existem milhões de refugiados ambientais em acampamentos por causa da desertificação; 1% dos brasileiros consomem 53% das riquezas do país e 10% não possuem nada, relação que gera a violência social, doméstica, contra mulheres e crianças, e o consumo de drogas.
“Vivemos numa organização social falida. Fui assaltado há alguns anos por um garoto e disse-lhe que ia entregar meu dinheiro, mas antes queria fazer uma pergunta. Ele concordou e eu perguntei se ele não tinha medo da polícia ou de ser preso. Ele disse que não, que se fosse preso teria uma cama, chuveiro quente, roupa limpa e três refeições por dia, conforto que ele não tem na rua”, contou. O professor lembra que em 1971 o Brasil foi participar de uma reunião em Estocolmo e disse aos países ricos: 'Queremos as chaminés de vocês'. O resultado foi Cubatão, que por muitos anos figurou como a cidade mais poluída do mundo.
“O habitat do homem é o espelho de seu desenvolvimento. O desenvolvimento sustentável depende de fatores multidimensionais, com princípios ecológicos, econômicos, culturais, políticos, e éticos, mas para que se promova mudanças é necessária a participação de toda a sociedade”, finaliza.
Sobre o professor
Mohamed Habib, 63 anos, graduou-se na Universidade de Alexandria, Egito, em 1964, onde também obteve mestrado na área de controle biológico. Foi pesquisador no National Research Center de 1965 a 1971. Iniciou carreira na Unicamp em 1972, doutorando-se em 1976 e chegou a professor titular em 1986. Publicou mais de duas centenas de trabalhos em periódicos de circulação internacional e em anais de congressos. Orientou mais de 40 teses.
terça-feira, 29 de setembro de 2009
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